segunda-feira, julho 23, 2018
Nha Cretcheu
"Nha cretcheu, meu amor, O nosso encontro vai tornar a nossa vida
mais bonita por mais trinta anos. Pela minha parte, volto mais novo e
cheio de força. Eu gostava de te oferecer 100.000 cigarros, uma dúzia de
vestidos daqueles mais modernos, um automóvel, uma casinha de lava que
tu tanto querias, um ramalhete de flores de quatro tostões. Mas antes de
todas as coisas bebe uma garrafa de vinho do bom, e pensa em mim. Aqui o
trabalho nunca pára. Agora somos mais de cem. Anteontem,
no meu aniversário foi altura de um longo pensamento para ti. A carta
que te levaram chegou bem? Não tive resposta tua. Fico à espera. Todos
os dias, todos os minutos, aprendo umas palavras novas, bonitas, só para
nós dois. Mesmo assim à nossa medida, como um pijama de seda fina. Não
queres? Só te posso chegar uma carta por mês. Ainda sempre nada da tua
mão. Fica para a próxima. Às vezes tenho medo de construir essas
paredes. Eu com a picareta e o cimento. E tu, com o teu silêncio. Uma
vala tão funda que te empurra para um longo esquecimento. Até dói cá ver
estas coisas mas que não queria ver. O teu cabelo tão lindo cai-me das
mãos como erva seca. Às vezes perco as forças e julgo que vou
esquecer-me."
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